Como um projeto de agricultura pode mudar a vida destas mulheres guineenses.
A igualdade de género é uma das áreas de atuação da Cooperação Portuguesa, que procura promover essa igualdade fomentando o empoderamento das mulheres e raparigas nos países parceiros como elemento fundamental para a prossecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e para um desenvolvimento global mais equitativo, justo e sustentável.
Neste Dia Internacional da Mulher, destacamos o projeto da União Europeia gerido pelo Camões, I.P. de Apoio Integrado ao Desenvolvimento Rural nas Regiões de Bafatá, Tombali e Quinara (UE-ACTIVA Eixo 3), que tem como preocupação fundamental promover a igualdade de género, combatendo as assimetrias no acesso à educação, na participação nos trabalhos agrícolas, na criação e posse de rendimentos ou tarefas domésticas, entre muitas outras atividades que regem o dia-a-dia das famílias.
Verifica-se que nas zonas rurais da Guiné-Bissau a taxa de escolarização primária líquida em 2011 era apenas 56.5%, sendo que a probabilidade de escolarização básica dos rapazes é 1,9 vezes superior à probabilidade das raparigas. Para as famílias mais pobres, isto significa que apenas cerca de 12% das mulheres sejam escolarizadas.
Neste contexto, o projeto promoveu cursos de alfabetização funcional nas comunidades, os quais melhoraram substancialmente o acesso das mulheres à educação com uma participação de 763 mulheres e 90 homens nos cursos realizados em 2019.
“Sinto-me motivada a aprender porque me sentia cega, não conhecia números nem letras. Agora estou a aprender, já percebo muita coisa e consigo escrever o meu nome”. Maria Sambú
Para Bacari Ndjai, professor e formador, uma das maiores dificuldades é a vergonha: “Muitos sentem-se envergonhados por estarem a aprender a ler e a escrever agora que são adultos e o que tenho feito é mostrar que nunca é tarde para se aprender, tentando-lhes deixar mais tranquilos e mostrar também a grande importância da alfabetização. Está tudo a correr bem e o ensino vai além da sala de aula: à noite costumamos fazer um Djumbai [convívio, reunião de pessoas] à volta das lições dadas.”
Na Guiné-Bissau, a mulher desempenha um papel central na produção agrícola, desde a lavoura até à transformação final dos alimentos. De forma a aliviar o peso e tempo consumidos pelas tarefas tradicionalmente desempenhadas pelas mulheres, como sejam a lavoura de arroz (alimento base da dieta guineense), a debulha, descasque (ato de pilar o arroz separando a casca do grão) e moagem de cereais (produção de farinhas), entre outras, o projeto promove a utilização de mecanização agrícola, nomeadamente tratores, motocultivadores, descascadores e moinhos de cereais, que tiveram um impacto visível nos agregados familiares dos cerca de 3160 membros das associações de produtores enquadradas no projeto.
No que diz respeito à geração de rendimentos, e tendo em conta que na Guiné-Bissau a horticultura é uma atividade predominantemente praticada pelas mulheres, o projeto promoveu ações de formação na área da produção, transformação e conservação de hortícolas. Entre 2016 e 2019, o projeto envolveu 1637 mulheres e 289 homens, o que resultou num aumento da quantidade e da qualidade da produção de vegetais, além de se introduzir novas formas de escoar os produtos com valor acrescentado para os mercados.
"Eu cultivo desde a adolescência, aprendi com os meus pais. A agricultura tem grande importância para mim e para a minha família, dela tiramos alimentos para o consumo familiar. Tenho 12 pessoas em casa. Uma parte vendo e uso o dinheiro para pagar a propina dos meus filhos. Esse dinheiro também é usado quando alguém adoecer.” Mariatu Cassama
Uma vez que muitos alimentos são excedentes de produção e se danificam ou ficam impróprios para consumo e para venda, é necessário conservar e transformá-los.
Quintazinha Cá, formadora, explica: “Esta formação tem grande importância para as mulheres, porque são elas que produzem hortaliças e muitas vezes se sentem obrigadas a comercializar os produtos a baixo preço com receio que estes estraguem. Um outro problema que esta formação vai resolver é o consumo de produtos importados dos quais muita das vezes se desconhecem as propriedades, contem conservantes nocivos à saúde, afigurando-se muito vantajoso o consumo de produtos naturais sendo o que estamos a incentivar para o bem da comunidade.”
Por fim, o projeto está a efetuar a distribuição de fogões melhorados que permitem poupar em cerca de 50% o consumo de lenha em comparação com os fogões tradicionais que mais não são do que pequenas fogueiras. Esta intervenção, além de ser extremamente positiva para o ambiente, reduzindo para metade o consumo de biomassa florestal, permite em paralelo aliviar os esforços despendidos noutra tarefa predominantemente destinada às mulheres e crianças: a recolha de lenha para satisfazer as necessidades energéticas dos agregados familiares.
“Já não uso muita quantidade de lenha, antes ia à mata muitas vezes recolher lenha. Agora os fogões são móveis. Antes não podia cozinhar à noite ou quando chovia, por não poder deslocar para dentro da casa as três pedras que anteriormente serviam de fogão.” Nobo Sanhá
Até outubro de 2019, o Projeto UE-ACTIVA Eixo 3 efetuou a distribuição de cerca de 1300 fogões melhorados por igual número de famílias enquadradas nas associações beneficiárias.
Sobre o projeto UE-ACTIVA Eixo 3
O UE-ACTIVA EIXO 3, Projeto de Apoio Integrado ao Desenvolvimento Rural nas Regiões de Bafatá, Tombali e Quinara, sendo um projeto de valorização e intensificação da agricultura, reconhece o papel incontornável das mulheres no meio rural e considera que, nas atividades acima descritas, dota as suas beneficiárias de novas ferramentas que resultam numa efetiva igualdade de género em direitos e deveres.
Com impacto nas cerca de quatro mil famílias residentes nas regiões de Bafatá, Quinara e Tombali da Guiné-Bissau, o UE-ACTIVA Eixo 3 teve início em 2016 e tem como objetivo geral contribuir para o desenvolvimento rural sustentável e inclusão social na Guiné-Bissau.
O projeto insere-se num Programa mais abrangente da União Europeia, o UE-ACTIVA, e que se organiza em três eixos:
- Eixo 1 para melhor governação regional;
- Eixo 2 para a melhoria das condições de acesso às zonas rurais;
- Eixo 3, para intensificação sustentável e valorização económica da produção agrícola intervindo ao nível das associações de produtores
Este terceiro eixo é cofinanciado e gerido pelo Camões, I.P., em nome de Portugal, num trabalho conjunto com a União Europeia, em prol do desenvolvimento rural sustentável da Guiné-Bissau.
Leia mais testemunhos da rubrica “Agricultura no Feminino” do projeto de cooperação delegada UE-ACTIVA em: https://www.facebook.com/programaueactivaintensificacaoagricultura/